A greve das Federais

12:21 LevantePE 0 Comentarios



"A greve das federais, certamente, se configurou como uma das mais importantes lutas do período recente do movimento educacional brasileiro. Mobilizou professores, estudantes e funcionários técnico-administrativos. Pautou o debate da educação questionando o modelo neodesenvolvimentista em curso, colocando em xeque a proposta de plano de carreira produtivista para os docentes e reivindicando condições de trabalho dignas para os/as trabalhadores/as.
É importante agora realizarmos uma avaliação da greve buscando extrair os elementos centrais desse processo para a juventude universitária, seus erros e acertos, identificando os desafios do movimento estudantil para o próximo período.
Novos lutadores e lutadoras do povo.
Em qualquer balanço, esta greve aparece como um marco histórico para as universidades brasileiras. A greve foi um processo importante de mobilização. Seu maior mérito foi colocar em movimento uma nova geração de jovens estudantes que acabaram de entrar nas Universidades e Institutos Federais. Esta mesma geração nasceu na década de 90, no auge do neoliberalismo, do sucateamento e desestruturação do ensino, do descenso das lutas de massa.
Essa juventude, em sua maioria, teve sua primeira experiência organizativa na greve, se formando enquanto militante social na pedagogia da luta. Findada a greve, é importante darmos consequência a esse processo de formação, reforçando o trabalho de base, fortalecendo os vínculos entre os estudantes e as suas entidades representativas, para assim acumularmos forças e termos condições de disputarmos na sociedade o nosso projeto de nação.
É neste movimento que podemos nos forjar enquanto novos lutadores e lutadoras do povo brasileiro, dando continuidade à luta pela transformação radical da sociedade. Nos lançamos ao desafio de protagonizarmos as lutas sociais, e fomos, estudantes e trabalhadores, protagonistas desta greve! A partir de pautas especificas e gerais, nacionais e locais, construímos lutas e mobilizações, dialogamos com a sociedade e pautamos a urgente e necessária transformação da universidade que necessitamos.
E quais equívocos foram cometidos?
Devemos ter a capacidade de após todo este processo, realizarmos uma avaliação crítica de nossos erros, inclusive aqueles referentes ao nosso comportamento enquanto movimento estudantil. A crítica e a autocritica não devem ser vistas como algo negativo, mas como necessárias para avançarmos na organização dos/as estudantes e nas lutas unitárias, que dialoguem com os desafios do tempo presente.
Esta greve estudantil partiu da necessidade da defesa intransigente da educação pública. Ela é fruto da expansão contraditória da educação superior, que possibilitou a entrada de centenas de milhares de estudantes nas universidades, mas que não foi acompanhada do investimento necessário para garantir a devida assistência aos estudantes e a valorização dos profissionais da educação. Logo, nos levantamos para que houvesse mais investimentos, melhores condições de trabalho na educação e políticas de permanência estudantil mais sólidas. Foi uma greve propositiva.
Mas houve movimentações equivocadas, das quais destacamos duas, por saltarem aos olhos de qualquer militante que estava construindo esta greve nas bases. O primeiro equívoco cometido foi a tentativa, fracassada, diga-se de passagem, de alguns setores da esquerda de elencar o REUNI como principal inimigo da greve. A realidade, porém, não perdoou este equívoco. Os/as estudantes não compraram este discurso, muito menos travaram lutas contra o REUNI, e onde predominou essa linha política, a greve estudantil tendeu ao esvaziamento.  Esses setores buscaram dar uma roupagem para a greve que no mínimo podemos chamar de surreal, e assim bradavam: “está é uma greve contra o PNE do governo e contra o REUNI”. Só se esqueceram de combinar isto com os milhares de estudantes que não compartilhavam desta análise. Nos locais em que a greve estudantil se massificou e obteve ganhos concretos, a luta travada pelos estudantes foi mais acertada e coerente, dialogando de fato com suas necessidades concretas: criticamos o REUNI e lutamos por um aumento nos investimentos, nas estruturas, na assistência; não lutamos contra a expansão de vagas.
O outro equivoco é consequência daquela leitura errônea e da necessidade exacerbada de autoconstrução de algumas tendências do movimento estudantil. Trata-se dos rumos que tomou o CNGE (Comando Nacional de Greve Estudantil). De inicio, o CNGE tinha tudo para ser uma ótima experiência de unidade, articulação e organização dos/as estudantes, para irmos às lutas de forma unificada e com direção coletiva; mas não foi o que ocorreu, e o CNGE perdeu seu potencial aglutinador. Esta ferramenta esvaziou-se de sentido e funcionalidade, uma vez que optou pelo caminho do sectarismo e do vanguardismo. Isso se verificou já na segunda reunião, que ocorreu no Rio de Janeiro, durante a Cúpula dos Povos, quando o CNGE hegemonizado por setores esquerdistas (ANEL/PSTU e alguns setores do PSOL), não concordaram em incluir no calendário de lutas da greve estudantil nacional uma data que foi proposta pelo CONEG (Conselho Nacional de Entidades Gerais), um dos fóruns da UNE, que contou com a presença de mais de 300 DCE’s de todo o Brasil. E qual o motivo? Simplesmente não queriam travar lutas em conjunto com a União Nacional dos Estudantes, pois isso “legitimaria a entidade”! Desta forma a ANEL/PSTU e tais setores do PSOL, se isolaram politicamente no CNGE, e mais que isso, comprometeram uma vez mais a unidade nacional do movimento estudantil e a capacidade de lutas massivas.
Uma greve com conquistas reais!
Apesar desses equívocos, saímos desta greve com conquistas reais para a educação brasileira e o conjunto dos estudantes. Conseguimos, por exemplo, aprovar na redação final do PNE (Plano Nacional de Educação), o investimento de 10% do PIB para a Educação, uma bandeira histórica dos movimentos sociais, que reivindicam uma universidade verdadeiramente popular, sendo que até 2017, pelo menos 7% tem de ser investidos. Também obtivemos a criação de uma Comissão Nacional de Avaliação do REUNI, articulada pela UNE, que será importante para monitorarmos e pressionarmos o governo para que sejam garantidos os investimentos em infraestrutura e assistência estudantil.
No plano local também saímos vitoriosos e com conquistas concretas, pois em muitas universidades os estudantes foram protagonistas da greve, tirando em assembleias as pautas e reivindicações locais, negociando e pressionando as reitorias, e saindo com conquistas importantes.
Desafios pós Greve
Com a greve, ficaram evidentes algumas questões que precisamos aprofundar o debate e superar: priorizar o trabalho de base, a organização dos/as estudantes, a formação política, a unidade, as lutas e o fortalecimento das entidades estudantis para articular e dirigir as lutas para o próximo período.
A União Nacional dos Estudantes (UNE), que historicamente cumpriu este papel, durante esta greve atuou apenas pontualmente. Cabe, portanto, uma crítica à direção majoritária da entidade, no sentido de que a mesma deveria ter jogado mais peso e dado mais intencionalidade, articulando os comandos locais de mobilização estudantil e dirigindo o processo de mobilização nacional. Contudo, como essa relação de confiança política para uma organização dirigir o movimento estudantil não vem da noite para o dia, entendemos que a UNE precisa melhorar sua presença na base, se empenhando para construir e preservar uma relação de confiança política com as organizações de base do movimento estudantil.
Concluímos com isso que, ao invés de colaborarmos para o divisionismo e fracionamento dos/as estudantes ou priorizarmos a autoconstrução a cima de tudo, nosso principal desafio é disputar e influenciar a UNE para as lutas sociais. Colocá-la cada vez mais ao lado dos trabalhadores/as. E essa disputa é necessária que façamos em cada universidade, colocando nossa energia nos CA’s e DA’s, nos DCE’s, priorizando o trabalho de base e a unidade nas lutas, e também participando dos fóruns da UNE como CONEG’s, CONEB’s e CONUNE’s.
Além destas tarefas, temos outras tanto mais urgentes, que se evidenciaram imediatamente no pós-greve. Devemos lutar pela aprovação do PNE e dos 10% do PIB para a educação, pela garantia da reposição de aulas e que o calendário de reposição seja construído em conjunto com os estudantes, garantindo que nenhum estudante seja prejudicado com a volta as aulas e não haja perseguição política.
Por fim, é preciso que apontemos para uma luta de massas, que coloque a educação de nosso país em outro patamar, a serviço do nosso povo, atenta a seus problemas. Para isso, teremos que acumular forças para construir um Projeto Popular de Educação.
Juventude que ousa lutar, constrói o poder popular!"

Por Thiago Pará, UFRRJ
Jessy Santos , UFS
e Filipe Rodrigues, UFSJ


0 comentários:

Postagem mais recente Página inicial Postagem mais antiga